Por Geovanna Veiga*
O celular vibra. Você pega sem pensar. Os minutos passam num piscar de olhos, e quando percebe, nem lembra por que o pegou. Esse gesto é banal na rotina da geração Z (nascida entre 1997 e 2012), para a qual o avanço tecnológico e a imersão nas mídias sociais ocorreram paralelamente ao seu desenvolvimento pessoal. Segundo pesquisa da Dazed Studio, com 600 pessoas entre 19 e 25 anos, 54% dos Gen Z passam mais de oito horas diárias online. Mas parte dessa geração começa a perceber a necessidade de ficar mais offline, em um desejo por equilíbrio e bem-estar. A pausa vem na forma de um jejum intermitente ou de um “detox” digital — uma decisão consciente de sair das redes e reconectar-se com o mundo fora da tela.
Ficar temporariamente sem acesso à rede melhora a saúde mental, mais até que o uso de antidepressivos, de acordo com estudo de pesquisadores do Departamento de Marketing, Economia Empresarial e Direito da Universidade de Alberta, no Canadá, publicado na revista científica PNAS Nexus. A estudante de Serviço Social Yasmin de Araújo, de 21 anos, percebeu isso ao mudar seus hábitos.

“Sentia que o ato de se comparar a outras pessoas nas mídias sociais se tornou um comportamento contínuo, prejudicial, que acelera o ritmo de vida. Os padrões de comportamento são mais intensos e perigosos nas redes”, testemunha a jovem.
Agora acostumada a ficar offline, acredita que viver o momento real é mais importante do que exibi-lo nas redes, e por isso pratica o exercício diário de desacelerar, o que diminui sua ansiedade. E dá dicas a quem quer tentar desligar um pouco das redes:
- Não tente sair de uma vez: reduza progressivamente o tempo de tela
- Procure atividades que substituam o uso de redes
- Aumente o tempo de contato com outras pessoas fora do digital
É em meio a esse movimento que pessoas acabaram por (re)descobrir hobbies em vez de passar horas em redes sociais, e se entregam ao prazer de atividades como a leitura, o artesanato, a fotografia ou esportes ao ar livre, como forma de se desligar do universo digital, desconectar de problemas profissionais, questões pessoais, aliviar o estresse. Yasmin, por exemplo, ocupa o tempo livre com a leitura de newsletters de cultura e artigos, e até mesmo mídias alternativas: “Crio meu próprio universo digital, mas com menos interações de terceiros”.
Bem-estar pessoal, vínculos reais e atenção à carreira tomaram a frente da lista de prioridades da estudante de História da Universidade Federal Fluminense Jaqueline Izidio, de 22 anos, que há dois meses desinstalou do celular o aplicativo Instagram, e tem procurado diminuir o tempo que passa online:
“Estava desconfortável com a forma como as redes funcionam, me sentia vigiada com mecanismos como os stories e funções como a contagem de visualizações de tweets. E não me acrescentava nada além da satisfação momentânea de estar por dentro das piadas e acontecimentos recentes”.
Em meio ao processo de detox e à entrega do trabalho de conclusão de curso, encontrou refúgio no crochê, na leitura e no simples ato de assistir a filmes. Segundo ela, a literatura, que ocupou um espaço constante na infância e na adolescência, foi muitas vezes deixada de lado para atender à pressão de permanecer conectada. Já o crochê, processo demorado e trabalhoso para uma iniciante, a ajuda com o foco:

“Acredito que esses hobbies foram importantes para me reconectar com o que eu sou para além de estudante, historiadora e professora em formação”.
Jaqueline Izidio
A retomada de um hobbie antigo, a leitura, também foi a escolha da social media Giovanna Temido, de 25 anos. A jornalista e publicitária se autodescreve como uma pessoa “cronicamente online”, e aprecia o ambiente virtual. Chegou a bater 12 horas diárias de consumo de redes, embora não saiba diferenciar exatamente quanto gasta com trabalho ou com lazer. O excessivo tempo online começou a incomodá-la, mas foi um gatilho maior — críticas à sua imagem, na época do carnaval — que a levaram a decidir, em prol da própria saúde mental, diminuir progressivamente o consumo virtual para quatro a cinco horas diárias de uso, há dois meses. Agora, pretende reduzir para duas horas.
“Está sendo um desafio, mas consegui voltar a um hobby muito significativo para mim, que é a leitura. Ler é um pilar essencial da minha personalidade, de quem eu sou”.
Sair das telas e buscar outras interações é uma prática também entre outras gerações, como os millennials. Um exemplo é a jornalista Mariana Freitas, de 34 anos, niteroiense radicada em São Paulo. Insatisfeita com o tempo que as redes sociais ocupavam na rotina já corrida, e com ressalvas quanto ao estímulo a ficar conectada o tempo todo, vinha fazendo pausas frequentes de um ou dois meses na sua conta no Instagram. Em janeiro, desinstalou o aplicativo, e não sabe se volta à rede.
“É um desafio se afastar do celular e um longo período de desmame, porque a roleta de dopamina que é a internet te ganha muito fácil. Agora vivo momentos muito positivos. Tenho certo vício em outras redes e também no celular, mas só o fato de ter me afastado do Instagram já ajudou muito”.
O tênis é uma das atividades que Mariana pratica para se desconectar das redes, do celular e da própria rotina. Ela chegou até a participar de competições amadoras do esporte.
As próprias redes sociais podem indicar meios de se desconectar. Uma pesquisa realizada pela Samsung Newsroom Brasil em 2022 revelou que 72% das 1.500 pessoas entrevistadas na faixa etária de 18 a 25 anos descobrem novos hobbies justamente nos ambientes digitais. A criadora de conteúdo digital Lari Much, de 30 anos, utiliza o Instagram (@larimuch) e o Tik Tok para incentivar as pessoas a experimentar novos hobbies. O quadro onde a influencer explora diferentes práticas, que vão da pintura à criação de vasos de vidro, alcança milhares de pessoas interessadas em se desafiar: as páginas da gaúcha têm respectivamente 60 mil e 42,2 mil seguidores.
Nessa jornada, Lari percebeu uma grande demanda entre seus seguidores, que precisavam de um incentivo mais próximo para começar a se envolver com algo novo. Por isso, ela criou no WhatsApp, uma comunidade onde mais de 3 mil mulheres se conectam para compartilhar vivências, trocar dicas e se aventurar em uma nova atividade a cada mês. O ambiente virtual também conta com uma área voltada à leitura: como em um clube do livro, as participantes escolhem dois títulos para ler, e marcam uma data para discutir as obras e trocar opiniões sobre outros livros. Ela própria pratica o detox digital, ao estabelecer uma rotina de uso saudável com o celular, limites de horário para ficar offline e focar em outras atividades, como a leitura:

“Uma das coisas que mais me impactaram foi o quanto os hobbies me proporcionaram autoconhecimento. Eu consegui me descobrir, identificar potenciais e ver coisas que ainda não tinha reparado”.
Lari Much
Os benefícios de se desligar das redes são enormes. E aí, vamos desconectar?
* Estudante de Jornalismo da PUC-Rio, aluna da disciplina Planejamento Editorial da professora Itala Maduell, em colaboração para a Voz Futura.