A bióloga venezuelana Yelitza Lafont chegou ao Brasil em 2018, entre os 7,7 milhões que saíram da Venezuela desde 2013. Hoje, a educadora social trabalha como assistente de Desenvolvimento Familiar na ONG Aldeias Infantis no Rio de Janeiro, onde auxilia refugiados a conseguirem emprego. Apesar de dificuldades, encontra tempo para trazer um pouco da Venezuela para o Rio de Janeiro. Começou o projeto Resgatando Raízes em 2021 na sua casa no Itanhangá. Toda tarde de sábado, ela se reúne com crianças de 6 a 10 anos nascidas na Venezuela para atividades como dança, desenho, produção de poesias e contos, além de cozinhar comidas tradicionais da Venezuela, como as arepas. Mas a prioridade é o idioma, já que muitas das crianças cresceram no Brasil e não sabem falar espanhol, apenas português.
Ela relembra o caso que motivou a iniciativa: “Visitei um casal de venezuelanos e a criança falava tudo em português. Fiquei admirada como ela desenvolveu a língua de vocês. Mas ela não fala nada em espanhol, nem sequer me entende. Aí eu falei para o pai: ‘Ô, Jorge! Olha a menina não fala espanhol. Jorge, eu acho que é você quem tem que falar para ela, entende? Entre vocês e sua mulher que falam perfeitamente espanhol, não é possível que a criança não fale nada, nem entenda o que eu falo’”, contou Yelitza, que conseguiu firmar uma segunda turma, desta vez de adolescentes que não foram alfabetizados. Ela comenta que é uma situação delicada e que precisa ter estratégia para lidar com isso: “Alguns desses jovens estão tendo muitos problemas de aprendizado. Você fala uma coisa e daqui a pouco ele já não entendeu nada. Não é tão fácil. Tem que ter muita estratégia”, explica a professora.

No projeto, Yelitza também faz apresentações, normalmente musicais, os chamados Acervos Culturais, quatro a cinco vezes por ano. Em dezembro, o projeto se apresentou nos Arcos da Lapa, no Centro do Rio, durante o Mural do Clima. O próximo deve ser no dia 25 de junho, quando se comemora o Dia do Imigrante no Brasil.
A educadora reforça a importância do projeto como uma forma de manter a cultura nativa viva. Ela diz que é muito grata pelo que conquistou no Brasil, mas que o coração dela está na Venezuela: “Que meus filhos, meus netos, que essas crianças venezuelanas que chegaram aqui em uma migração forçada com seus pais, com seus familiares, nunca esqueçam disso. As crianças que estão comigo aqui sabem muito da Venezuela porque eu falo e obrigo os pais delas (a incentivar cultura). Eu amo muito a tapioca e eu gosto muito do pão de queijo, mas eu não deixo de comer arepa. Entende? Eu amo forró, gosto muito, mas eu não posso deixar de ouvir roropo”.
Formada em Ciências da Natureza pela Universidade Nacional Experimental Simon Rodriguez, na Venezuela, com direito a certificado de excelência na faculdade, Yelitza está em busca de validar seu diploma para dar aulas no Brasil. Deu entrada na UFF meses atrás para começar o processo, e aguarda o aceite.
Além do projeto, Yelitza é uma figura de liderança entre os refugiados em meio às dificuldades. A professora auxilia refugiados a conseguirem melhores condições de vida. Ela fala da importância de tratamento digno para imigrantes:
“Meu trabalho dentro da comunidade ou população de imigrantes é levar essa voz. Você é digno também. Você tem direito com respeito e como você tem direito também tem deveres e a gente precisa respeitar também”
*Thiago Pimentel, estudante de Jornalismo da PUC-Rio, aluno da disciplina Planejamento Editorial da professora Itala Maduell, em colaboração para a Voz Futura.