Por Giulia Amendola
Criar um festival internacional de cinema do zero é muito mais do que selecionar filmes e abrir as portas para o público. É um exercício de articulação cultural, captação de recursos e construção de uma rede que conecte artistas, produtores, público e instituições. No caso do Festival Internacional Goitacá de Cinema, esse desafio se amplia pelo pioneirismo: trata-se de um projeto inédito na região Norte e Noroeste Fluminense, um território com imenso potencial criativo, mas historicamente carente de políticas culturais estruturadas e investimentos consistentes no audiovisual.
A escolha de Campos dos Goytacazes como sede não é casual. A cidade tem uma relação profunda e antiga com o cinema brasileiro, já foi cenário de produções marcantes e hoje abriga um movimento crescente de valorização da cultura local. O festival nasce conectado à retomada do projeto da Escola Brasileira de Cinema e Audiovisual e carrega um forte componente afetivo e acadêmico, fruto da trajetória pessoal do idealizador que, décadas após se formar na UENF, retorna para consolidar um polo cinematográfico enraizado no território.
Com seis dias de programação, 65 filmes, mostras competitivas e temáticas, debates, formações, masterclasses e um mercado audiovisual estruturado, o I Festival Internacional Goitacá de Cinema não se limita a exibir obras — ele propõe um encontro de culturas, fomenta a economia criativa local e projeta a região para o Brasil e o mundo. Mais de cem profissionais estão diretamente envolvidos, movimentando hotéis, restaurantes e serviços, e reforçando o papel do evento como um marco para a descentralização e o fortalecimento da produção cinematográfica brasileira.
Confira a entrevista exclusiva de Fernando Sousa, diretor do Festival, para a VOZ Futura.
Quais são os maiores desafios de se criar do “zero” um festival internacional de cinema?
Criar um festival internacional de cinema do zero é um processo desafiador em múltiplas frentes. Exige a construção de uma rede sólida de parceiros, curadores, patrocinadores e apoiadores, além de enfrentar as dificuldades estruturais e orçamentárias, especialmente quando se está fora dos grandes centros. No caso do Festival Internacional Goitacá de Cinema, o desafio foi ainda maior por estarmos implantando um projeto inédito na região Norte e Noroeste fluminense, que historicamente carece de políticas culturais estruturadas e de investimento contínuo na área do cinema e do audiovisual.
Além disso, há a urgência de fortalecer os mecanismos locais e regionais de incentivo à cultura, de pensar políticas públicas estruturantes e de articular um ecossistema sustentável de produção, exibição e formação. Mesmo com leis importantes como a Rouanet, a Aldir Blanc e a Paulo Gustavo, os baixos investimentos dos estados e municípios dificultam a descentralização dos recursos e travam o avanço do setor. Por outro lado, há muitos desafios na busca por investimento privados e as leis de incentivo são fundamentais. Criar esse festival também passa por articular um espaço de encontro, de valorização da cultura local e de construção de um mercado regional, o que estamos fazendo por meio do Cine Market Goitacá e do Seminário de Cinema e Audiovisual do Norte e Noroeste Fluminense.
Por que em Campos Goytacazes?
A escolha de Campos dos Goytacazes para sediar o I Festival Internacional Goitacá de Cinema está profundamente conectada à história e à potência cultural da cidade. A idealização do festival nasce no contexto da retomada do projeto da Escola Brasileira de Cinema e Audiovisual, apresentado inicialmente à Reitora da UENF, professora Rosana Rodrigues. Em 2024, essa proposta ganhou força com a realização de diversas ações voltadas ao cinema e ao audiovisual, como exibições, debates e oficinas de formação.
Um dos marcos desse processo foi o lançamento do curta-metragem “Campos é uma Cidade de Cinema”, em agosto de 2024 — uma obra que homenageia tanto o projeto original da escola quanto a rica e muitas vezes invisibilizada contribuição da cidade e da região ao cinema brasileiro. A cidade possui uma história centenária com o cinema brasileiro. Fora que Campos já foi cenário de grandes filmes do cinema brasileiro, como o filme “Chuvas de Verão”, do Cacá Diegues.
Além disso, Campos é parte da minha própria trajetória pessoal e acadêmica. Foi aqui que me formei em Ciências Sociais pela UENF, e foi também para cá que retornei, quase duas décadas depois, para cursar o doutorado e reencontrar o sonho de consolidar uma escola de cinema enraizada no território. O Festival Goitacá é, portanto, mais do que um evento: é a materialização de um compromisso afetivo, acadêmico e político com o fortalecimento da cultura cinematográfica em Campos dos Goytacazes e na região Norte e Noroeste fluminense.
Quantas pessoas são esperadas? Vocês têm uma ideia da previsão de impacto econômico para a cidade/região?
O I Festival Internacional Goitacá de Cinema já em sua primeira edição está agregando diretamente mais de cem postos de trabalho, movimenta o setor hoteleiro, bares, restaurantes e diversos serviços da cidade. Além das cinco mostras competitivas e da Mostra Embratur, teremos o Seminário de Cinema e Audiovisual do Norte e Noroeste Fluminense, o Programa de Formação, o Cine Market Goitacá e duas ativações turísticas que projetam a região para o Brasil e o público internacional. São seis dias de evento, com 65 filmes em exibição, diversas mesas de debates, oportunidades de formação na área, masterclass nacionais e internacionais e atividades de mercado pensadas para promover a economia do cinema e do audiovisual no norte e noroeste fluminense.
Estamos falando de um evento com mais de 100 convidados brasileiros e internacionais. Ou seja, para além de todos os impactos positivos na economia, é importante reforçar que o festival nasce projetando simbolicamente Campos e a região para todo o Brasil e internacionalmente.
Confira os destaques do Festival.
Mostra Internacional
Local: Centro de Convenções Oscar Niemeyer – UENF – Cine Darcy
Agarra-me Forte (Agarra-me Fuerte) (2024)
Direção: Ana Guevara e Leticia Jorge
Uruguai. Ficção. 74 minutos. 14 anos
Data e horário de exibição: 23 de agosto, às 19h30
Berta (Berta) (2024)
Direção: Lucía Forner
Espanha. Ficção. 17 minutos. 12 anos
Data e horário de exibição: 22 de agosto, às 17h30
Mostra Brasileira
Local: Centro de Convenções Oscar Niemeyer – UENF – Cine Darcy
O Silêncio das Ostras (2024)
Direção: Marcos Pimentel
Minas Gerais. Ficção. 127 minutos. 12 anos
Data e horário de exibição: 22 de agosto, às 13h30
Outros Abrigos (2024)
Direção: Thiago CardosoParaná. Documentário. 19 minutos. 14 anos
Data e horário de exibição: 23 de agosto, às 16h
Mostra Zezé Motta
Othelo, O Grande (2023)
Direção: Lucas H. Rossi dos Santos
Rio de Janeiro. Documentário. 83 minutos. Livre.
Data e horário de exibição: 20 de agosto, às 11h
Seco (2025)
Direção: Stefano Volp
Rio de Janeiro. Ficção. 17 minutos. 12 anos
Data e horário de exibição: 21 de agosto, às 16h30
Mostra Kbrunquinho
Local: Centro de Convenções Oscar Niemeyer – UENF – Auditório Principal
PiOinc (2024)
Direção: Alex Ribondi e Ricardo Makoto
Distrito Federal. Ficção. 17 minutos. Livre.
Data e horário de exibição: 19 de agosto e 24 de agosto, às 10h
Passa a Bola (2024)
Direção: Guilherme Herrera Falchi
São Paulo. Ficção. 15 minutos. Livre
Data e horário de exibição: 19 de agosto e 24 de agosto, às 10h
Mostra Olhares da Planície
Local: Centro de Convenções Oscar Niemeyer – UENF – Cine Darcy
Anti Amor (2025)
Direção: Carlos Eduardo Gomes Hypolito
Campos dos Goytacazes, RJ. Ficção. 28 minutos. 14 anos.
Data e horário de exibição: 23 de agosto, às 18h
Lázaro (2024)
Direção: Marco Pinheiro
Campos dos Goytacazes, RJ. Ficção. 10 minutos. 10 anos
Data e horário de exibição: 23 de agosto, às 18h
Local: Centro de Convenções Oscar Niemeyer – UENF – Cine Darcy
Foto de destaque: Mariana Jaspe