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Em Trânsito: O que fazer para não quebrar?

Em Trânsito: O que fazer para não quebrar?

Todo mundo tem seu algo-ritmo.

Por Pedro Pirim Rodrigues, confudador da Voz Futura

A minha impressão é que as mídias sociais se tornaram, em algum momento, o equivalente aos encontros efêmeros dos elevadores de prédios comerciais e residenciais. Um bom dia, uma boa tarde, um comentário sobre o clima: “Tempinho maluco, né?”. Se está calor, é porque está insuportável, se está frio, é porque fica quase impossível sair de casa. Se chove muito, corre risco de alagamento, se não chove nada, corre risco de seca. Será que o mesmo acontece dentro de nós também? E será que vem acontecendo de forma cada vez mais acentuada ao ponto de nós, seres humanos, estarmos repetindo os mesmos desgastes que geramos na terra, dentro de nós mesmos?

Já não temos mais estações tão bem definidas como em outros tempos, e o tempo já não é mais como era antigamente. Medimos tudo por números, dados, estatísticas, mas esquecemos que cada coisa tem seu tempo. Cada planta, cada pessoa, cada espécie tem seu rítmo e não um “algo-ritmo” (rs). Me considero um bom “pai de planta”. Mas já matei algumas por falta ou excesso de água. Cada uma tem sua dose, sua rega e seu jeito de ser. Um grau pra cima ou pra baixo pode fazer toda a diferença. As plantas se adaptam e encontram o melhor jeito pra elas sobreviverem mesmo com a nossa falta de manejo. Eu venho tentando encontrar a minha melhor forma também.

Pra ficar mais leve, costumo pensar na vida como duas crianças que brincam em uma gangorra. Nem tão alto, nem tão baixo, mas o segredo é manter o equilíbrio, encontrando em toques sutis no chão, a altura ideal para poder flutuar, se sentindo leve, o que me remete a sonhar, e o fincar os pés no chão. No livro “A insustentável leveza do ser”, logo de cara nos pegamos nessa contradição. Da polarização entre o que é bom, ser leve, e o que é ruim, ser pesado, o escritor propõe que o peso é necessário para nos tornar reais, e nos aterrar, assim como a leveza é importante para nos fazer sonhar e levitar. (essa foi a minha breve interpretação de quem começou o livro agora.)

Mas essa gangorra da vida não é fácil, porque assim como na brincadeira de criança, ela não depende só de nós. E a mesma beleza que existe no sentido de não sermos capazes de sobreviver sozinhos, também mora o desafio que é compartilhar uma gangorra com pessoas que podem ou te jogar muito para o alto, ou te deixar no chão. E nessa dança das mil gangorras que brincamos ao longo da vida, é importante encontrar quais pessoas, contextos, ecossistemas, nos permitem sentir o toque leve dos pés no chão, nos lembrando de que o peso das coisas pode sim ser bom para nos aterrar, mas que é também preciso levitar de vez em quando. O que não dá é para ser içado de um lado para o outro, pra cima e pra baixo, uma hora muito quente, outra hora muito frio, porque se não o que acontece é exatamente a mesma coisa que está acontecendo com o nosso planeta terra – sobre o qual nós temos sido os grandes responsáveis pela sua destruição uma vez que não sabemos brincar de gangorra com ele – aceleramos ao ponto da terra dilacerar e agora estamos nos dilacerando por dentro também.

Essas mudanças bruscas de clima não são só obra do acaso. São efeito de causa. Sinal de desequilíbrio que nós causamos. E quando a natureza perde o equilíbrio, ela tenta se ajustar. Às vezes, na marra. O mesmo vale pra gente. Quando as emoções oscilam demais, a alma também tenta se autorregular. Um dia a gente explode, no outro se fecha. Se aquece demais, depois congela – mas quando se regenera? O corpo treme, a mente cansa, o coração parte. Literalmente. A rachadura que se abre na terra é a mesma que se abre dentro da gente quando se sente demais, sem pausa, sem respiro. E o problema de um corpo rachado é que as pessoas se aproveitam das brechas para entrar e das nossas fendas para escalar. (“Fecha seu corpo, Pirim” – disse uma vez uma amiga pra mim)

Precisamos entender qual nosso momento de correr, de parar, de chover, de chorar. Nosso momento de parar diante o sol e deixar queimar, de se sentir abraçado pelo calor, mas não deixar virar ferida. De respirar o ar leve sem deixar virar furacão por dentro. Assim como a natureza. O equilíbrio é o que garante a vida. E talvez o que falte pra muita gente hoje não seja mais tempo, e sim ritmo. Aprender a sentir sem se dilacerar. A se mover sem se romper. A oscilar sem quebrar. Em movimentos leves, contínuos, como em uma gangorra, que foi feita para brincar. 

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