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Casa da Favela amplia o protagonismo na FLIP

Casa da Favela amplia o protagonismo na FLIP

Espaço criado pela ANF projeta recorde de público e lançamentos em 2025.

Por Pedro Luiz Meireles*

A Casa da Favela volta a marcar presença na tradicional Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), com uma programação robusta, diversa e profundamente conectada às vozes dos territórios populares do Brasil. Em sua terceira edição, o espaço, promovido pela Agência de Notícias das Favelas (ANF), não apenas consolida seu papel como um dos centros de resistência cultural do evento, mas também apresenta novidades que prometem tornar a participação deste ano ainda mais potente. 

“A literatura das periferias é presente, é futuro e segue ocupando com força o centro do debate cultural no Brasil”, fala uma das coordenadoras da Casa, Jaque Palazzi, refletindo o espírito que move a curadoria do evento, que este ano será realizado de 30 de julho a 3 de agosto na histórica cidade na Costa Verde fluminense.

Conceição Evaristo: símbolo e afirmação

A presença da escritora Conceição Evaristo na Casa da Favela é um marco simbólico. Figura central na valorização da escrita negra e da memória das favelas, Conceição Evaristo representa o que o espaço defende desde sua criação: a literatura como ferramenta de transformação social. 

“Ter Conceição na nossa programação é uma honra e uma afirmação do que defendemos”, reforça Jaque Palazzi. Sua presença, no entanto, não ofusca a pluralidade de vozes que a Casa se empenha em apresentar — pelo contrário, impulsiona ainda mais a valorização de novas narrativas.

A Favela no Multiverso: o tema que guia a edição 2025

Com o tema “A Favela no Multiverso”, a programação da Casa da Favela deste ano é construída para evidenciar a pluralidade de subjetividades que compõem a vida nos territórios periféricos. Logo na abertura, o “Julho Delas” coloca no centro do debate as mulheres negras, indígenas e periféricas, guardiãs de memórias, saberes e histórias de resistência.

Estão confirmadas mesas com Jandira Feghali, Dani Balbi e Dandara Suburbana, entre outras convidadas. As conversas prometem destacar não só a presença dessas mulheres nas lutas políticas e culturais, mas também sua produção intelectual e literária.

Outro destaque são os painéis que exploram a relação entre tecnologias ancestrais e tecnologias digitais, conectando oralidade, memória e futuro a partir de uma perspectiva periférica. Nomes como Wesley Barbosa, referência em literatura e justiça social, e Elisa Lucinda, multiartista de forte presença poética e política, também marcam presença na programação. 

Selo editorial próprio e 30 lançamentos previstos

Uma das grandes novidades deste ano é o lançamento do Selo Editorial Casa da Favela, iniciativa para dar autonomia editorial de autores periféricos, que enfrentam dificuldades históricas de acesso às grandes editoras. O primeiro título é “Grita! Histórias & poemas de impacto”, da artista e cineasta  Kaliman Chiappini, que alerta sobre liberdade e direitos das mulheres. A obra é fruto de quatro anos de viagens e vivências de Chiappini em viagens pela Índia, África (Gana, Costa do Marfim, Tunísia), Oriente Médio (Qatar, Omã) e Nepal. 

A Casa projeta a marca de 30 novos títulos lançados durante o evento, ampliando a produção de edições anteriores. A curadoria, conduzida em diálogo com editoras independentes, coletivos e os próprios autores, prioriza nomes com longa trajetória nas periferias, muitos deles com mais de dez livros publicados, mas ainda pouco conhecidos fora de seus territórios. Entre os escritores confirmados estão Poeta CJ, Melquisedec Ramos, Edson Santana, Preto Vivo, Hugo Paz e Carlos Augusto. 

“Levar estes nomes à Flip é garantir que suas vozes circulem, que suas histórias ganhem espaço na mídia, que sejam ouvidos, lidos, reconhecidos”, destaca Jaque Palazzi.

Projeções para 2025: mais público, mais trocas, mais escuta

Após reunir mais de 2 mil pessoas em 2024, a expectativa da Agência de Notícias das Favelas é que a Casa supere a marca de 3 mil visitantes em 2025. E o motivo não é apenas o crescimento do espaço, mas a força da programação, o aumento das conexões com coletivos de todo o país e a consolidação de um público leitor interessado na produção das margens.

A presença da Casa também representa um gesto de acolhimento para o público que, muitas vezes, não se vê refletido nos eventos literários tradicionais. A ideia é simples: ocupar Paraty com a linguagem das favelas, com seus personagens, seus autores, suas vozes.

Os desafios para manter um espaço como a Casa da Favela dentro de um evento da magnitude da Flip ainda são grandes, sobretudo financeiramente. “Viabilizar deslocamento, hospedagem, transporte de livros e garantir estrutura digna exige muito esforço coletivo”, pontua a coordenadora. Mais do que um espaço cultural, a Casa da Favela se consolida como uma estratégia política: de fortalecimento das redes periféricas, de construção de parcerias e, acima de tudo, de afirmação de que a favela também escreve, publica, lê e transforma.

“Quando penso na Casa, me encorajo com as palavras de Carolina Maria de Jesus, que me sussurram: ‘Ah… comigo o mundo há de modificar-se. Não gosto do mundo como ele é.’ Estamos para modificar, tensionar, propor, construir e afirmar que a literatura da favela é literatura brasileira, é patrimônio, é presente e é futuro.”

Jaque Palazzi

*Estudante de Jornalismo da PUC-Rio, aluno da disciplina Planejamento Editorial da professora Itala Maduell, em colaboração para a Voz Futura.

Créditos das fotos: Divulgação Instagram.

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